População do papagaio-de-cara-roxa é contabilizada no litoral do Paraná e de São Paulo
A surpresa do censo deste ano foi o registro de 60% do total de papagaios em um único dormitório
Os censos populacionais são realizados para verificar se a população de determinada espécie está se reproduzindo e conseguindo se manter em sua área de ocorrência. Há 14 anos, este trabalho é feito anualmente para registrar a população mínima de papagaios-de-cara-roxa (Amazona brasiliensis), espécie que vive somente na Floresta Atlântica, no trecho que vai do litoral sul de São Paulo ao litoral norte de Santa Catarina, englobando todo o litoral paranaense.
O Censo deste ano, realizado no início de junho, contabilizou, no total, 8.380 papagaios, 6.548 no Paraná e 1.832 em São Paulo. Os números, registrados pela Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS), que desenvolve desde 1998 o Projeto de Conservação do Papagaio-de-cara-roxa, mostram que, em média, a população se manteve em relação ao ano passado, quando foram registrados 9.176 papagaios.
O censo é realizado de forma simultânea em 17 dormitórios ao longo do litoral do Paraná e litoral sul de São Paulo. Em Santa Catarina não foi localizado nenhum dormitório, pois os indivíduos não foram mais visualizados nessa região. No Paraná, foi percebida uma dinâmica no uso dos dormitórios, ao longo dos anos, porém as maiores concentrações acontecem em quatro deles, que estão no Parque Nacional do Superagui, Estação Ecológica da Ilha do Mel, APA de Guaraqueçaba e Reserva Indígena da Cotinga.
Este ano, os biólogos do Projeto tiveram uma surpresa ao registrar a maioria da população que habita o litoral do Paraná – cerca de quatro mil papagaios, 60% do total – no dormitório da Ilha da Cotinga. Elenise Sipinski, coordenadora do projeto, explica que nos anos anteriores as maiores concentrações era registradas na região do Parque Nacional do Superagui. Os resultados deixavam os biólogos em alerta, já que foi verificado que os papagaios que dormem na Cotinga e Ilha do Mel passam o dia nas regiões da Planície litorânea de Pontal do Paraná, entre a região do Maciel até a Ponta do Poço, em Pontal do Sul, locais que poderão ser transformados em região Portuária.
O litoral do Paraná abriga um relevante patrimônio natural em toda sua extensão, onde é possível registrar uma grande diversidade de fauna e flora que depende desse ambiente para existir, como é o caso do papagaio-de-cara-roxa. Em conjunto com o litoral de São Paulo, concentra o maior remanescente contínuo de Mata Atlântica ainda bem conservado em toda a costa brasileira.
“Nos preocupa a intenção do governo de transformar a região de Pontal do Sul em um complexo portuário que levará destruição aos ambientes naturais, além de outros impactos sociais. É possível levar desenvolvimento para os Municípios do litoral de forma compatível com suas características naturais e culturais das comunidades sem comprometer a biodiversidade e a dinâmica natural”, opina Elenise.
Trabalho conjunto
Monitorar espécies é fundamental para acompanhar a qualidade do ambiente e propor medidas de conservação. Mas para tanto é necessário uma estrutura de logística e de capital humano. O projeto de Conservação do Papagaio-de-cara-roxa realiza o censo há mais de 15 anos porque tem apoio anual de parceiros e de um grupo de voluntários. Este ano, cerca de 40 voluntários apoiaram a realização das contagens ao longo de três dias.
O Tiago Bedin Saciloto, que participou pela segunda vez, conta que o envolvimento da população litorânea com a causa é perceptível. “Um morador da região foi com a gente para auxiliar na contagem, a comunidade tem interesse e demonstra conhecimento sobre a espécie e a região”, explica. Isso se deve, também, ao trabalho de educação para conservação realizado desde o início do projeto, que busca informar e sensibilizar a população sobre a ameaça do comércio ilegal de animais e a importância de manter conservado o habitat do papagaio.
Sobre o projeto
Há 16 anos, o acompanhamento das populações da espécie Amazona brasiliensis é executado pela SPVS na região do Lagamar, ou Complexo Estuarino Cananéia - Iguape - Paranaguá. O censo populacional da espécie é uma das ferramentas mais importantes para garantir um acompanhamento adequado das populações remanescentes desse papagaio endêmico de uma estreita porção da costa sul brasileira. O estudo anual proporcionou a saída da categoria ameaçada para vulnerável em 2015, uma conquista importante para a conservação da espécie e que referenda o bom estado de conservação das áreas que habita. Ações de educação para a conservação com comunidades locais, fomento ao turismo de natureza e a implantação de ninhos artificiais para incrementar a reprodução da espécie complementam o trabalho, além de iniciativas constantes voltadas ao combate ao comércio ilegal de animais na região. Apoiado por fontes múltiplas, como Fundación Loro Parque, Fundação Grupo Boticário e FUNBIO, o programa de conservação do papagaio-de-cara-roxa tem uma estratégia discutida com outras quatro espécies brasileiras, a partir de coordenação do ICMBio, permitindo uma discussão periódica sobre a evolução em cada região de ocorrência das medidas conservacionistas a serem tomadas em cada caso.